RÁDIO LIVRE FILHA DA MUDA

A Universidade Federal do Acre (Ufac) está sendo sacudida literalmente pelo movimento de uma onda, o que não ocorria desde o começo dos anos 90, quando estudantes do PC do B e do PT começaram a conquistar o poder e a engordar na máquina pública estadual. Novos estudantes, professores e agregados da sociedade acreana formam o "coletivo Lagartixa", que impulsiona a Rádio Livre Filha da Muda. Há mais de uma mês a emissora 105,7 FM desafia a fiscalização da Anatel com uma programação improvisada, constituída basicamente de músicas no formato MP3 pirateadas na web.

Transmissor, mesa de som, compressor, torre e antena custaram R$ 8 mil, coletados com a realização de festas, venda de camisetas e pequenas doações dos participantes do Coletivo Lagartixa, que não admite ter o "rabo preso" com ninguém.

Anatel reage
A Rádio Livre Filha da Muda dispõe de um transmissor com apenas 25 watts de potência, mas tem sido sintonizada cada vez mais pela população nos pontos da cidade onde sua programação chega sem interferência.

O Coletivo Lagartixa sonha em consolidar a emissora com seus microfones abertos à manifestação livre de qualquer pessoa, desligada de ingerência política e sem interesses comercias.

- Quando alguém tenta segurar a lagartixa pelo rabo, ela se liberta da parte fisgada, vai embora e o rabo logo se regenera - explica a estudante Raquel Ishii, do curso de letras, umas das maiores entusiastas da rádio livre.



O coletivo também está se articulando para proteger o próprio rabo, pois o gerente da Anatel no Acre, Cícero Eloy, já recomendou ao reitor Jonas Filho a desativação da emissora.

Muda ecoa
As rádios livres desafiam as leis no país, querem quebrar o monopólio das grandes empresas de telecomunicação e não se adequam ao esquema comercial de transmissão. Geralmente são perseguidas, lacradas e seus programadores acabam presos.

O que inspirou o surgimento da Rádio Livre Filha da Muda em Rio Branco foi a experiência, em Campinas (SP), da Rádio Muda, que resiste há mais de 10 anos no ar, criada por estudantes da Unicamp. Os paulistas vieram ao Acre para dar suporte técnico e teórico aos acreanos.

A Rádio Muda possui diversos programadores, que formam o "coletivo anti-autoritário coordenador" da emissora. Segundo eles, esse modo de gestão garante liberdade de opinião, participação e expressão a cada novo e velho integrante, que tem a possibilidade de fazer como bem entender o seu programa, o que assegura diversidade de sons e idéias.

As rádios universitárias surgiram no país na década de 90. São ligadas a universitários, mas não são necessariamente ligadas a universidades. São mantidas por alunos, mas não contam com o apoio explícito das reitorias, que fazem vista grossa para o trabalho dos alunos e professores.

O ambiente é quase igual no Acre, sendo que a rádio livre do coletivo Lagartixa ocupa espaço no anfiteatro e usa telefone da Ufac. A preocupação agora é com o administrador da Anatel no Acre, que pode recorrer à justiça para que a Polícia Federal seja requisitada a confiscar os equipamentos. Por causa da autonomia universitária, a entrada da polícia no campus dependeria da autorização da reitoria.

Piratas oficiais
Francisco Pereira da Costa, chefe do departamento de direito, já se comprometeu em arregimentar estagiários do curso para a defesa jurídica da rádio. Gerson Albuquerque, do departamento de história, é outro professor empenhado na organização da emissora.

Anteontem, quase cem pessoas participaram de um debate sobre a questão das rádios livres, promovido pelo coletivo Lagartixa na universidade. Um juiz federal foi convidado, mas não compareceu.

O principal debatedor foi o jornalista Antonio Alves, do blog O Espírito da Coisa e da assessoria do governador Jorge Viana, que defendeu toda forma de pirataria como salvação da sociedade contemporânea.

Toinho, ex-ativista do movimento estudantil, na UNB e na Ufac, onde não conseguiu concluir os cursos de arquitetura e história, animou o coletivo Lagartixa e acabou muito aplaudido.

- Liberdade de expressão é uma coisa que nasce com quem se expressa. Você realmente está querendo se expressar de uma maneira livre ou você está apenas querendo dizer: 'me pague, mas não me censure?' Os jornais daqui ficam reclamando da liberdade de expressão, da censura do governo, e de vez em quando a gente se agita pra defender a liberdade da Gazeta. Nenhum desses jornais quer ser livre. Eles querem só mesmo o dinheiro do governo. Se alguém disser: vocês serão livres, inclusive financeiramente, eles dirão que querem ser escravos e censurados. O que me interessa, o que me importa, é ir para o informal, o ilegal, o alternativo, o que não está regulamentado - afirmou.

O jornalista relatou (assista ao vídeo abaixo) a dificuldade dos ex-agitadores da Ufac, que agora governam o Acre, em lidar com as novas formas de organização dos estudantes.




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