quinta-feira, 21 de junho de 2007

BOIADA ANIMA "GOVERNO DA FLORESTA"

A empresa Bertin Ltda, a segunda maior no processamento de carnes no país, começa a se instalar no Acre turbinada pelo empréstimo de U$ 90 milhões do Banco Mundial e pelo entusiasmo de fazendeiros e políticos do "governo da floresta". Nos próximos três anos, segundo o agrônomo Judson Valentim, pesquisador da Embrapa, o frigorífico contribuirá para que o rebanho bovino do Acre salte de 2,6 milhões para 4,3 milhões de cabeças.

Na Amazônia, a Bertin já atua no Pará, Mato Grosso e Rondônia e, junto com o Banco Mundial, tem sido duramente criticada por Ongs e institutos de pesquisa que atuam na região, que tentaram sensibilizar a instituição a desistir de financiar um empreendimento classificado pela próprio banco na categoria A de risco ambiental, isto é, capaz de resultar em "impactos diversos, irreversíveis ou sem precedentes" na Amazônia.

O frigorífico Bertin vai abater diariamente 1,2 mil bois, que serão comprados de pecuaristas do Acre e do Sul do Amazonas. O ex-governador Jorge Viana, que agora preside o Fórum Empresarial do Acre, é o mais entusiasmado com a presença do frigorífico no Estado. Ele acredita que a empresa contribuirá para o desenvolvimento da pecuária e da indústria e a consequente geração de emprego e renda. "A floresta não sofrerá pressão porque no Acre existem regras. Além de mim, existe a ministra Marina Silva e o governador Binho Marques para buscar o melhor possível para a população".

Na semana passada, quando o Grupo Bertin anunciou que fará investimento de R$ 75 milhões na construção de um frigorífico no Acre, o governador Binho Marques (PT), também não escondeu a empolgação. Nos anos 80, Marques era um dos braços do sindicalista Chico Mendes na organização da resistência dos trabalhadores rurais contra a expansão da pecuária na região. "Estou muito feliz porque, neste momento, o Acre tem o valor agregado do Grupo Bertin. Sua presença é a marca dos eixos de uma economia, limpa e competitiva", disse o governador.

A Bertin tem no horizonte a exportação de carne para os mercados do Peru, Bolívia, Estados Unidos e Ásia por causa da localização estratégica do Acre, a partir da abertura da Estrada do Pacífico. A direção repetiu no Acre que a empresa não comprará gado de pecuaristas “que não possuem títulos de terras ou apresentam documentos fraudulentos”.

Relatório FAO, órgão da ONU voltado para agricultura e combate à fome, ressalta os potenciais prejuizos ao meio ambiente: "o setor pecuário é responsável por 9% do CO2 procedente de atividades humanas, mas produz um percentual muito mais elevado dos gases de efeito estufa mais prejudiciais. Gera 65% do dióxido nitroso de origem humana, que tem 296 vezes o Potencial de Aquecimento Global (GWP, na sigla em inglês) do CO2. A maior parte deste gás procede do esterco". A FAO também considera que a pecuária não só ameaça o meio ambiente, mas também é uma das principais causas da degradação do solo e dos recursos hídricos.

Dinheiro público
Para o pecuarista Assuero Veronez, presidente da Federação da Agricultura do Acre, o aumento do rebanho no Estado tammbém não significará pressão nos arredores da floresta. Ele disse que a Bertin vai gerar demanda apenas nas áreas já desmatadas e que façam incorporação de tecnologia. "O que nós queremos é buscar cada vez mais a certificação das propriedades para evitar agressão ambiental. Muitos ambientalistas fazem terror, mas o dinheiro público investido em empreendimentos como esse da Bertin é bem mais produtivo para o país do que aquele que o Ministério do Meio Ambiente destina às Ongs".

O pesquisador Judson Valentim assinala como virtude da Bertin a disposição de comprar carne apenas de empresários cujas propriedades estejam regularizadas. "O produtor que não tiver nível tecnológico ficará de fora", avalia Valentim, que está preocupado com o fato de que 52% do rebanho bovino está localizado em propriedades com até 500 cabeças, o que corresponde a 96% dos proprietários.

Segundo Valentim, no início da década de 70, um hectare de pastagem alimentava 1,14 cabeças de gado bovino por ano e as pastagens, geralmente, degradavam três a cinco anos depois de formadas. Em 2004, a pecuária bovina, com um rebanho de 2 milhões de cabeças, ocupava 81,1% das áreas desmatadas no Acre, com 1,3 milhão de hectares de pastagens e taxa de lotação média de 1,54 cabeças por hectare.

Entre 1990 e 2004, o rebanho bovino do Acre cresceu 416%, enquanto a área desmatada aumentou 147%. O pesquisador considera que isso foi possível graças à adoção de tecnologias que contribuíram para o prolongamento da vida produtiva média das pastagens, passando de 3-5 anos para 10-20 anos; e para o aumento da capacidade média de suporte das pastagens no Estado, passando de 1,1 cabeças por hectare, em 1970, para 1,54 cabeças por hectare, em 2004. "Este aumento de 38% na taxa de lotação das pastagens permitiu evitar o desmatamento de 630 mil hectares de florestas, para a implantação de pastagens no Acre entre 1970 e 2004", afirma Valentim.

Passivo ambiental
Apesar destes esforços, apenas cerca de 40% dos pequenos, médios e grandes produtores do Acre adotaram tecnologias que aumentam a produtividade e a rentabilidade da pecuária, além de reduzir os impactos ambientais dessa atividade. "O Acre precisa ampliar as políticas que premiem os produtores que adotem processos produtivos que não dependam do desmatamento e das queimadas, permitam a recuperação de áreas degradadas e a sua reincorporação aos processos produtivos, tenham produtividade acima da média do Estado e sejam mais intensivos no uso de mão-de-obra em relação aos sistemas agrícolas tradicionais", recomenda Valentim.

Existe, ainda, no Acre, a questão do passivo ambiental, isto é, aqueles desmatamento superiores a 20% das áreas, ocorridos antes da legislação que limita em 20%. Quem desmatou 50%, que era permitido antes, após a restrição ficou com 30% de área desmatada. Para casos assim, o governador Binho Marques instituiu durante a semana um grupo de trabalho para elaborar uma proposta de regularização do passivo ambiental das propriedades rurais.

"O governo estadual continuará buscando novas políticas para promover sistemas de produção agropecuários e agroflorestais sustentáveis, com foco na recuperação das áreas degradadas e aumento da produtividade nas áreas já desmatadas e na promoção da preservação e uso sustentável dos recursos florestais. Estabelecemos as regras com o Zoneamento Ecológico-Econômico e o governo deverá se pautar por isso para poder orientar o processo de desenvolvimento", disse o secretário de Meio Ambiente, Carlos Edegard de Deus.

Leia mais no site Amazônia.

6 comentários:

Anônimo disse...

Altino,
Um baixinho, arrumadinho, vulgarmente conhecido como ÁGUIA DE HAIA, num determinado discurso falou para todo mundo ouvir: "triste (ou burro) é o homem que quer permanecer parado num mundo de constantes renovações. Estou com ele e não abro.
Veja: os pastos estão abertos, o capim plantado e o nelore abundando. A aftosa está anunciada. Mas pode ser evitada.
E agora? Vamos esperar o Edgard de Deus (?) dizer o que se pode fazer? O processo desenvolvimentista está nas suas mãos? Quem dita as normas?
Acabei de lembrar do Dr. Amim Hamu, de Brasília, que imaginava o Acre tal qual um condado do Reino Unido. Com vacas gordas e gente feliz. Não, não é. O Acre é um mix de reserva moral com o inferno. O Acre é a própria vaca. É o próprio inferno. Tem mato e tem pasto. Tem Marina e tem Sibá.
Olhe, de petróleo, não entendo nada, mas , de vaca e embutidos, entendo tudo.
Vamos rodar a roda. Tá na hora.
Sem medo de ser feliz.
Sem retrancas. Sem toureiros, sem vaquejadas.
Infeliz do homem que fica quieto diante de tantas indignações. Viver bem é preciso. Ninguém é obrigado a pensar o pensamento do vizinho, ou do amigo.
Que venga el toro! Essa é minha forma de contribuir, ou, em ultima instância, de não atrapalhar. Os puristas estão em decadência. O zoneamento é mais uma zona de gabinete, sob encomenda. E, se não for, que Deus me livre das pragas.

Leila Jalul

Anônimo disse...

Depois de tanto anos de pesquisa a produtividade da pecuária é de 1,54 cab/ha!
Considerando que o Acre só produzisse boi gigante, de 20 arrobas(300kg), e num tempo record de 30 meses (2,5 anos), com o preço de R$40,00 a arroba daria uma renda de R$40,00 x 20 arrobas/2,5 anos = R$320,00/ano/hectare de renda bruta. Considerando que a rentabilidade da pecuária é 15% (Não é a fazenda do Renan Calheiros que dá 60% de rentabilidade!) nos melhores sistemas, o produtor irá ganhar R$48,00/Ha/ano! É muito pouco para um mercado que, potencialmente, paga US$18.00 por ton de carbono.

Anônimo disse...

Floresta desmatada leva 70 anos para recuperar nutriente

RAFAEL GARCIA
da Folha de S.Paulo

Um estudo que analisou como as áreas desmatadas da Amazônia se recuperam ao longo do tempo traz hoje uma notícia boa e uma ruim. Ao analisar florestas que voltaram a crescer depois de terem sido derrubadas, cientistas descobriram que, ao longo do tempo, elas recuperam seu nível de nitrogênio, um nutriente fundamental para o solo. O processo, porém, leva décadas.

"Nós temos a boa notícia de que a floresta se regenera e ainda recupera seu ciclo de nitrogênio; a má notícia é que isso leva pelo menos 70 anos", diz Luiz Martinelli, pesquisador da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da USP) e autor principal do trabalho.

Em estudo na edição de hoje da revista 'Nature' (www.nature.com), Martinelli e colegas detalham como esse processo ocorre.

No início, a floresta em regeneração dá lugar sobretudo a árvores que conservam nitrogênio (emitem poucos gases com esse elemento) e não sofrem muita queda de folhas. Só após algum tempo, quando a mata secundária ("capoeira") restabelece seu nível de nitrogênio, espécies que dependem desse elemento em abundância retornam ao ambiente.

Mas isso não quer dizer que a biodiversidade se recupere. Após esse período de cerca de 70 anos, a floresta retoma só entre 70% e 80% de sua biomassa original e, ainda assim, com uma vegetação bem menos diversa.

"Mas agora, sabendo melhor como o sistema funciona, podemos estudar intervenções", diz Martinelli. Entre medidas que podem acelerar a regeneração de mata secundária está, por exemplo, o plantio de leguminosas, que ajuda a floresta a reter nitrogênio. Adubo com fósforo, em outra frente, poderia suprir a falta mais crônica desse outro nutriente.

Editor disse...

O governo é da floresta, mas as comemorações são sempre para: criador de gado, usineiro, petróleiros e por aí vai. Te cuida floresta.

Anônimo disse...

Para o bom êxito do empreendimento, sugiro convocar o presidente bovino do Senado, Renan COWlheiros, como administrador senior e o Sibá Machado como omBOIdsman. Quanto aos possíveis problemas para o efeito estufa, é seguir fielmente o ditado que recomenda: enfiar peido em cordão.

Saudades do Acre disse...

Leila, o baixinho estava (quase) certo, ao menos para o contexto da época dele. Renovar é substituir por algo novo ou melhor. Mas algo novo também pode ser pior. Ao expandir os pastos e as criações de gado, realmente estaremos substituindo a floresta e sua biodiversidade por algo novo; melhor? Duvido muito. Saudações democráticas do seu fã. Aliás, prepare o autógrafo e a dedicatória. Estarei aí.