quinta-feira, 12 de março de 2009

SEM ACORDO

Antonio Alves

Confesso que fico irritado com essa pressa dos jornais e jornalistas acreanos em aderir ao tal acordo ortográfico. Agora, onde se pode colocar "do Acre" eles substituem por "acriano", para demonstrar sua alegre rendição às novas regras. Fiquei ainda mais chateado quando vi releases da Agência de Notícias do governo estadual usando tal aberrante palavra. E agora, pra completar, um supermercado que tinha por slogan "orgulho de ser acreano" já declara, em suas propagandas, orgulho de escrever como os colonizadores e colonizados d'além mar.


Todo mundo sabe que isso é golpe da indústria do livro, qualquer um é capaz de imaginar o tamanho da bolada que o governo vai gastar, nos próximos anos, republicando todo o material didático, do primeiro ano à universidade. Uma mina de ouro. Necessidade mesmo, não existe. Ninguém deixa de entender um romance do Saramago por alguma palavra grafada sem hífen, subumano ou coisa semelhante, assim como não é preciso traduzir Guimarães Rosa para que os portugueses o entendam e apreciem.

Eu havia decidido ignorar essa reforma idiota. Como escritor, não necessito dela: uso meu idioma, aquele que aprendi de meu povo e que vou aperfeiçoando e adaptando às minhas preferências. É um lindo idioma, com origens diversas: no português antigo, no nheengatu, nas influências de diversas imigrações, nos sucessivos colonialismos culturais, na criativa reação popular, na antropofagia dos modernos, na contribuição regional de panos e aruaks... o que faltar, vou inventando.

As regras são simples. Sei que aqui cabe uma vírgula mas por estilo não coloco. Onde não cabe, entretanto, coloco, por prudência e para facilitar o entendimento. Devo ter usado o trema duas ou três vezes na minha vida. Logo percebi sua inutilidade e não preciso que me venham agora, tantas décadas depois, dizer que posso escrever tranquilo sem colocar aqueles dois pontinhos tão preciados por alemães e noruegueses.

A liberdade que tenho corresponde a uma grande tolerância para com os erros alheios. Se deixo de seguir as regras que conheço mas não aceito, não fico espezinhando aqueles que não seguem por ignorância. Não sou revisor do mundo e, embora pense que os comunicadores devam escrever com um razoável grau de correção em respeito ao senso comum, defendo a idéia, já expressa por um famoso escritor antes que eu nascesse, de que a crase não foi feita para humilhar ninguém. Aliás, o erro pode estar -e frequentemente está- a serviço da evolução da língua e do alargamento de sua abrangência. Tendo a achar tudo interessante mas, francamente, uma reforma que faz com que tantos escribas passem a se autodenominar "acrianos" é uma lástima.

Nasci no Acre, vou morrer acreano.

Antonio Alves escreve no blog Tempo Algum.

14 comentários:

Anônimo disse...

Ah, Toinho...
Me rendo a seu texto, pois concordo com cada letra e vírgula, mesmo que elas estejam em desacordo com a tal reforma.
Rachel Moreira
Acreana

Anônimo disse...

Também acho essa história de "Acrinos", uma grande Putária. fiscura e coisa que o valha.

Grupo de Choro Afuá disse...

Você está sentindo o efeito minúsculo, do mais mínimo possível, que de maneira não equivalente sentem os desprovidos de domínio do falar e escrever culto de uma língua antecedente a Reforma Ortográfica. Imagina os dominadores do Nheengatu(língua boa)obrigados a falar a Língua Portuguesa e abandonar o Tupinambá. Dentre esta situação de adotar ou não o Acordo, isso é o mínimo sofrível, tendo em vista ser grandioso o preconceito a muitos pobres sem condições necessárias e oportunidades para aprimoramento linguístico de prestígio social que a classe dominante exige. A situação de adotar é minúscula, comparando com a estigmatização que muitos sofrem com o não domínio da norma culta. Se muda o paradigma, todos começam do zero. Não importa o que você era antes, importa agora que todos podem se atualizarem de maneira igual.

Anônimo disse...

Ora pois,de facto é um problema.Efectivada esta reforma,doravante seremos todos analfabetos,até que se faça a reciclagem de todos nos.Eu particularmente,aguardo manifestação de Rui Barbosa,para situar me. BETO MINEIRO.

Anônimo disse...

toin to contigo que coisa feia esse negocio de iscrever acreano com i sou de boca do acre portanto amazonenso mais me considero acreano p o puro de origem BRUZGU

Anônimo disse...

Não sei que drama é esse de reclamar, reclamar o PT num mudou o horário, o povo do Acre acatou sem contestar, por que não mudar a gramática...engulam mais essa!!!

Wesley Diogenes disse...

Antes brigavam por 1 hora acrescentada no horário, agora por causa de "i" em vez de "e". A próxima birra será por qual motivo hein?

Não vivemos o tempo da estagnação e da letargia, acho que se faz necessário se adaptar com as mudanças, que sempre se fizeram e se fazem necessárias para a construção de que algo novo posso se realizar.

Eu não deixo de ser Acriano porque a norma ortográfica assim acredita ser o correto.

Anônimo disse...

ó Toinho, que tipo de escritor é vc, que não se adequa as mudanças da língua, afinal nosso cotidiano é feito de paradigmas.

Anônimo disse...

Após 36 anos apresentando-me como acrEana, sinto-me ridícula ao redigir acrIana... Parece que cometi um gravíssimo erro.

Anônimo disse...

aproveita, Ana Cristina, e ensaia a pronúncia ACREANA, isso mesmo, quero ver qual é o Acriano que pronuncia [acreãnu]. Quando vocÊ ver um ET, chama ele de Marteano e não maciano.

Anônimo disse...

Bem,
O pior nesta história é que a única palavra que a maioria dos jornalistas grafam na nova mudança é justamente Acriano...

Anônimo disse...

Quem nasceu no Iraque, por acaso é iraquEano? Não! É sem dúvida iraquiano.

Anônimo disse...

Altino, já que você é tão contra reformas, devia ainda escrever pharmacia, facto, etc...Tudo na vida evolui, inclusive a lingua (falada e escrita), vc como jornalista devia ser o primeiro a saber, já que certamente, "por toda a sua vida", vc esta usando regras gramaticais que foram adquiridas em reformas ortográficas, vc gostando ou não.O que seria se cada um resolvesse escrever do jeito que achasse certo?! Acreano ou acriano, tanto faz, mas o certo (é bom avisar a professora do jornal a gazeta) agora é acriano!

ALTINO MACHADO disse...

idiota anônimo: quem escreveu foi toinho.